Quem não gosta de celebrações criativas, vibrantes
e envolventes? E quem não se encanta com a aventura de mergulhar cada vez mais profundamente
no antigo e sempre novo, fascinante e terrível Mistério de Deus? Quem não se
sente chamado irresistivelmente a amá-lo como é amado? Mas essa experiência
sedutora de um Deus que nos ultrapassa infinitamente e nos ama
incondicionalmente não pode fazer-nos indiferentes à sorte dos nossos irmãos e
irmãs, às duas dores, preocupações e esperanças. Jesus unifica o amor a Deus e
o amor ao próximo, como dois trilhos do mesmo trem.
No Evangelho de hoje, Mateus nos relata o
esforço quase desesperado dos fariseus para fazer Jesus tropeçar em algum ponto
da correta doutrina religiosa e moral do judaísmo. Eles já o haviam provocado
com a questão dos impostos devidos ao império romano. Tinham notícia também de
como Jesus havia enfrentado a armadilha preparada pelos saduceus, em torno da
questão da ressurreição dos mortos. E agora voltam com uma questão de doutrina
religiosa e de espiritualidade: qual é a hierarquia dos mandamentos, qual deles
é o mais importante?
É claro que os fariseus não querem aprofundar so
conhecimento sobre Deus e seu Reino. O que eles procuram insistentemente é um
motivo para rejeitar globalmente o ensino de Jesus e tirá-lo de circulação. E
quando perguntam qual é o maior mandamento da lei, querem dar a entender que os
mandamentos são muitos, e a definição do mais importante é uma operação
teológica complicada e arriscada. Os mandamentos seriam vários e não teriam um
eixo que os move e em torno do qual giram.
Jesus não se intimida, e responde à pergunta
provocadora com serenidade e clareza. “Ame o Senhor seu Deus com todo teu
coração, com toda tua alma e com todo tua inteligência. Este é o primeiro e
grande mandamento.” Dando essa resposta, parece que Jesus se conforma à
expectativa de todos seus interlocutores e opositores, e não deixa margem para
qualquer crítica ou desconfiança. Entretanto, mais que uma resposta
estratégica, a resposta de Jesus é uma afirmação que vai ao centro da questão
religiosa.
Em primeiro lugar, parece que Jesus dá a
entender que se trata de amar a Deus, mas não de amar de qualquer maneira.
Jesus não propõe um amor sentimental ou voluntarista. Ele sublinha um amor
lúcido, racionalmente orientado (com toda tua mente); um amor encarnado na vida
e nos gestos cotidianos (com toda tua alma); e um amor decidido, sensível e
humano (com todo teu coração). Este amor está a quilômetros de distância de um
mero sentimento que se desfaz em lágrimas diante das catástrofes mas mergulha
na indiferença diante da opressão e dos golpes feitos em nome da moralidade.
O que Jesus nos propõe com este mandamento
‘primeiro e central’ é uma vida integralmente centrada em Deus e na sua
vontade. E isso é muito mais que amar a Deus como um entre os muitos objetos ou
sujeitos que podem realizar nossos desejos. Amar desse modo significa ter Deus
e o seu Reino como a referência absolutamente central das nossas opções,
práticas e projetos. Deus não pode ser simplesmente mais uma pedra na
construção, mas a arquitetura que a define e o alicerce que a sustenta.
Mas Jesus não se detém na resposta aprovada
pela ortodoxia e esperada pelos líderes religiosos. Ele surpreende a todos
dizendo que há um segundo mandamento, com o mesmo valor e inseparável do
mandamento primeiro e central: “Ame o seu próximo como a si mesmo.” Esse
mandamento era conhecido pelos fariseus e doutores da lei, mas eles – como
muitos de nós – jamais o colocariam no mesmo nível de importância do amor a
Deus. Isso soaria como uma heresia horizontalista.
Para não deixar dúvidas, Jesus afirma de forma
lapidar que todas as escrituras se resumem e realizam nesses dois princípios. A
vontade de Deus, aquela vontade que em cada oração do Pai-Nosso pedimos que
seja realizada, se concretiza num amor terno, lúcido e firme dirigido ao mesmo
tempo a Deus e aos nossos semelhantes, especialmente àqueles que se encontram
socialmente e humanamente mais fragilizados. E é daqui que parte também toda
profecia, missão hoje tão urgente quanto complexa.
Deus pai e mãe, amor que envia e sustenta missionários
que dedicam a própria vida para recordar que o amor a ti e ao próximo vão
sempre de mãos dadas: te agradecemos porque suscitas pessoas que, sustentadas
por teu amor, dão o melhor de si mesmas para que as juventudes tenham seu lugar
reconhecido e os mais pobres possam viver dignamente. Que teu santo Espírito
ajude a Igreja a recriar e anunciar teu Evangelho como boa notícia que aproxima
todos os seres humanos. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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