Maria simboliza a humanidade liberta e
solidária.
Lucas apresenta Maria como uma mulher que sabe
ouvir a Palavra viva de Deus e que está pronta a dar o melhor de si para que
esta Palavra se realize na história. É alguém que ousou acreditar na força da
Palavra e na fidelidade daquele que a pronuncia. Deus pôde realizar grandes
coisas nela e através dela porque encontrou em Maria a base humana
indispensável. Não fazemos bem quando a idealizamos e desumanizamos, tirando-a
da história. Para fazer-se humano o Filho de Deus precisou de uma pessoa
fundamentalmente humana, não de uma criatura angélica e desencarnada do mundo!
Depois da experiência de ser amada e de ser
chamada a gerar e dar à luz aquele que é a Luz do mundo, Maria vai
apressadamente à casa de Isabel. Busca nesta família fiel um sinal que confirme
a parceria de Deus com os humildes, sua aliança com os pobres e a veracidade de
suas promessas. A discípula se faz serva, a serva se mostra peregrina e a
peregrina experimenta a hospitalidade na casa de Isabel. Abraçadas no amor de
um Deus que não esquece sua misericórdia, duas mulheres louvam a Deus e
profetizam publicamente. A discípula, serva e peregrina se transforma em
profetiza destemida. Maria contempla a história do seu povo e proclama a
intervenção libertadora de Deus.
Por isso, Maria simboliza uma Igreja com
traços femininos. Nela e com ela, a Igreja é chamada a construir-se como corpo
que acolhe, aquece, alimenta, ensina, respeita e favorece o crescimento e o
amadurecimento dos filhos e filhas. Uma Igreja institucionalmente rígida,
fechada, autoritária, legalista e doutrinária tem pouca relação com a figura
feminina de Maria. Com Maria e suas companheiras mulheres é possível construir
uma Igreja que vive intensamente a alegria do Evangelho, que deixa de ser
alfândega e tribunal para ser lar e enfermaria que sai para acolher e cuidar,
como quer o Papa.
Inspirada em Maria, a Igreja precisa criar
espaços e condições favoráveis para o desenvolvimento de homens e mulheres
maduros, livres, despojados, solidários e comprometidos com a salvação do
mundo. Um corpo ou uma instituição que se impõe pelo medo e pela lei estaria
condenado à esterilidade e nunca terá a graça de sentir os filhos e filhas
saltarem de alegria no seu ventre. Seria um corpo incapaz de conhecer a
felicidade, e permaneceria um túmulo de homens e mulheres que não chegam a
nascer verdadeiramente. Deus nos livre de uma Igreja com nome feminino mas com
estruturas masculinas!
Na origem da vocação à vida consagrada está a
experiência de um Deus que olha nos olhos e, sorrindo, nos chama pelo nome. Ou
uma experiência como aquela de Maria e de Isabel: “Alegra-te, cheia de graça! O
Senhor está contigo!” E então, a partir disso, os pés percorrem caminhos e o
corpo estremece de alegria por receber inesperadamente a visita de Deus na
própria casa. A vocação à vida religiosa não é primariamente um caminho de
purificação moral ou de desprezo do mundo, mas a experiência de plenitude de
uma graça que não cobra méritos: dar de graça aquilo que de graça se recebeu.
Itacir Brassiani msf
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