Minha fé na ressurreição é maior que o medo de
perder a vida?
Instalados no alto da pirâmide social e
religiosa, os saduceus rejeitam e ridicularizam a fé na ressurreição, e
desafiam Jesus. Jesus enfrentou a ideologia religiosa dos fariseus, negando-se
a se submeter ao templo (cf. Lc 20,1-8), comparando-os a vinhateiros homicidas
(cf. 20,9-19), dando a volta por cima do nacionalismo fanático que incitava a
não pagar impostos (cf. 20,20-26). E então chega a vez dos saduceus, que
aparecem para criticar a fé dos fariseus e ridicularizar o ensino de Jesus,
especialmente a ressurreição dos mortos.
Desde o tempo destes heróis do judaísmo, crer
na ressurreição não tem nada a ver com a atitude de quem não se importa com as
contradições e violências da história e se refugia no valor pretensamente
superior de uma outra vida. A fé na ressurreição dos mortos é luz que ilumina a
mente e nos ajuda a visualizar um mundo radicalmente distinto e
qualitativamente novo. É também força que sustenta a luta para construí-lo, e a
coragem para resistir às seduções que os privilégios e comodidades do presente
exercem sobre nós.
Jesus responde à teologia cínica dos saduceus
discutindo a forma como se dá a ressurreição e apresentando o seu fundamento. Começa
afirmando que a vida ressuscitada não é uma simples cópia da vida presente, mas
uma nova qualidade relacional, uma nova ordem existencial, uma vida de plena
comunhão com Deus e livre da necessidade de sucesso e de perpetuação da
espécie. É isso que Jesus quer dizer quando fala que “os que forem julgados
dignos de participar do mundo futuro e da ressurreição “não se casam” e “já não
poderão morrer”, porque “serão iguais aos anjos” e “filhos de Deus”.
Por isso, a fé na ressurreição não é apenas
uma questão antropológica, da necessidade humana de assegurar a vida. É uma
questão teológica: se enraíza em Deus, cresce na luta, se fortalece na resistência
e se alimenta da esperança. É nessa perspectiva que adquirem sentido as
palavras do apóstolo Paulo: “O próprio nosso Senhor Jesus Cristo e Deus, nosso
Pai, que, na sua graça, nos amou e nos deu uma consolação eterna e uma feliz
esperança, confortem vossos corações e vos confirmem em tudo o que fazeis e
dizeis de bom.”
Acreditando na ressurreição e tirando todas as
consequências desta fé, façamos o possível, como diz Paulo, “para que a Palavra
do Senhor se espalhe rapidamente e seja glorificada”. E esta palavra viva e
vivificante é uma Boa Notícia: os coxos andam, os cegos veem, os surdos ouvem,
os pecadores são justificados, os pobres recebem boas notícias e os mortos
ressuscitam; em outras palavras: a história não é monolítica e fechada, as
sementes germinam, o mundo tem jeito, a morte e o medo não têm a última
palavra.
Itacir Brassiani msf
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