O seguimento de Jesus é uma realidade de todas as comunidades cristãs, e muito mais no Carmelo, por isso todo momento é oportuno para partilhar o que o número dois da Regra nos sugere à reflexão.
Estamos acostumadas a ler este número apenas em sua parte central: “viver em obséquio de Jesus Cristo, servindo-o fielmente com puro coração e reta consciência”, como se ele se referisse apenas aos carmelitas. Se lermos atentamente a parte inicial, nos daremos conta de que a Regra do Carmo recolhe toda a História da Vida Religiosa e nos dá o carisma central que orientou e orienta a mesma. Aquilo que lemos como algo exclusivamente nosso, é comum a toda Vida Religiosa. Assim nos diz o texto: “Em diferentes ocasiões e de diversas maneiras os santos Padres estabeleceram de que forma cada um, em qualquer Ordem ou modo de vida religiosa que escolha, haja de...”. Alberto, aqui faz menção de toda a História da Vida Religiosa, desde as virgens consagradas e os movimentos dos ascetas, passando pelo Monaquismo com suas diversificadas formas de vida. Ele recolhe o carisma comum da Vida Religiosa, que é o que estamos acostumadas a ler como exclusivamente nosso. Após isso, ele dá o passo para o estilo novo que os eremitas do Monte Carmelo já estão vivendo e querem que seja reconhecido e aprovado pela Igreja: “Mas como nos pedis que segundo o vosso propósito, vos demos uma fórmula de vida que estejais obrigados a guardar daqui por diante”.
Se olharmos historicamente, “viver em obséquio de...” é uma expressão típica do feudalismo, época em que surge o movimento carmelitano (cf. COMO PEDRAS VIVAS.. .NO CARMELO, Emanuele Boaga). Esta é uma das razões históricas, por que o Carmelo faz do “viver em obséquio de Jesus Cristo” a centralidade e a essencialidade do seu viver. Os carmelitas não querem viver em obséquio do senhor feudal, mas em “obséquio de Jesus Cristo”.
Do significado da palavra “obséquio”, é que irrompe toda a profundidade do ser chamado por Deus a uma consagração a Ele e nos faz chegar ao carisma original da Vida Consagrada: a Virgindade (cf. Iniciação à História Monástica 1). Obséquio quer dizer: “dar um presente, fazer uma oferta, um dom (cf. Fr. Rafael. 14.10.03 à Comunidade de Santo Ângelo)”.
Se viver em obséquio de Jesus Cristo, é fazer de nossa vida um presente, uma oferta, um dom em seguimento a Ele. Isto nos remete intrinsecamente ao carisma original da Vida Consagrada: a Virgindade. Virgindade que, no seu sentido mais profundo, teológico e existencial é: “não viver senão unicamente para o Deus verdadeiro, não se curvar jamais a um ídolo”. Isto vem confirmado pelo que a Regra propõe como modo de obsequiar a Jesus Cristo: “servindo-o fielmente com puro coração e reta consciência”. Não está aqui secretamente oculto todo o amor do Carmelo por Maria, ela a Virgem por excelência, que jamais se curvou senão somente ao Deus verdadeiro? Deus nasce de uma virgem, símbolo de um povo, “o Emanuel, o Deus conosco nasce de um povo virgem, não vendido aos ídolos, não cúmplice das injustiças. (...) Maria é, em sua virgindade grávida, aquilo que a humanidade é chamada a ser desde a criação: templo e morada abertos e disponíveis, com todas as possibilidades latentes, como página em branco para receber as inscrições do Espírito e tornar-se ‘uma carta de Cristo’ (cf. 2Cor 3,2), imagem de Deus” (Maria, Mãe de Deus e Mãe dos pobres).
A virgindade é o carisma originalmente da Vida Consagrada, e ele está subentendido no “viver em obséquio de Jesus Cristo”. Como fazer de sua vida um presente, uma oferta, um dom a Jesus Cristo, senão vivendo a virgindade no sentido profundo que Maria a viveu como protótipo de todo filho e filha de Deus? A virgindade no seu sentido mais amplo e profundo é um projeto, um caminho a ser percorrido que está contido nas palavras de Jesus: “sejam perfeitos como é perfeito o Pai de vocês que está no céu” (Mt 5,48). Portanto, não é algo que já está pronto no começo de um chamado, mas um itinerário a ser percorrido sempre. Assim o Advento nos remete ao carisma essencial e originalmente da Vida Religiosa: “Voltados inteiramente para Deus, fazendo de nossa vida uma oferta para encarnar o Verbo e oferecê-lo à humanidade em nosso ser, encarnação viva e transparente de Jesus Cristo”.
A Regra não se refere a Maria, nem a Elias, no entanto eles permanecem como fonte de inspiração e modelo de seguimento para nossa vida carmelitana. Em “Carmelita um estilo de vida”, comenta- se porquê não foi Paulo a fonte de inspiração e o modelo, uma vez que a Regra se refere a ele abundantemente. E que os primeiros carmelitas encontraram na vida de Maria e Elias uma aproximação ao que eles estavam vivendo e queriam continuar a viver.
Maria, a primeira discípula de Jesus Cristo, é protótipo de todo discípulo. Seus dogmas não são privilégio unicamente seu. São a luz que brilha no horizonte da humanidade: “O que Deus fez em Maria e com Maria, fará em nós e conosco também”. Este é o sentido da vinda do Filho de Deus ao mundo: ser filhos e filhas de Deus no seu Filho Jesus, razão e sentido de viver em seu seguimento.
Ir. Rejane Maria
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