O Espírito Santo, dom que nos vem do Pai pelo
Filho, possibilita aos discípulos e discípulas, não obstante as barreiras do
tempo e do pecado, uma relação pessoal com Jesus Cristo. E esta relação começa
com a experiência de ser chamado pelo nome, pelo que somos realmente. A Deus
não importam as funções hierárquicas, os papéis sociais ou eclesiais, os
títulos de crédito ou de honra, as fraquezas éticas e morais, mas unicamente o
nome, a realidade humana que existe e subsiste sob toda esta indumentária, maquiagem
ou sujeira. O nome expressa nossa identidade mais profunda e original.
Reconhecendo a voz daquele que nos chama pelo
nome, descobrimos também que Jesus nos conduz para fora. Ao bom pastor não
interessa atrair o rebanho para dentro de um redil e conservá-lo seguro, mesmo
que este redil se chame Igreja. Ele não quer conduzir as pessoas a uma vida
interior projetada como indiferença para com o mundo exterior. Como bom pastor,
ele chama pelo nome e conduz aqueles que o ouvem para fora de si mesmos e para
fora de um sistema que anestesia e, concomitantemente, separa, hierarquiza e aprisiona
as pessoas. O Bom Pastor nos chama e nos manda sair às periferias! Ele não
apenas pronuncia nosso nome com delicadeza: ele nos confia uma missão, ele nos
envia!
Neste percurso, o próprio Jesus caminha à
nossa frente, livre e solidário, militante e sonhador, cordeiro e pastor. Ele
não considera suficiente despertar os homens e mulheres e mostrar-lhes um
caminho. Ele se faz caminho e companheiro de caminhada, um pouco à frente para
dissipar medos e incertezas, mas sempre próximo para curar feridas e fortalecer
nos tropeços. No fim, ele é porta aberta em forma de cruz, passagem-páscoa para
a liberdade, seta que aponta para um outro mundo possível e urgente. O
importante é reconhecer sua voz que nos chama pelo nome e nos manda sair porta
a fora de nós mesmos.
Enquanto pastor, além de manter uma relação
personalizada com cada pessoa, Jesus também reúne um rebanho, uma comunidade,
uma coletividade. O caminho de saída, sem deixar de ser pessoal e tocar a cada
um, é sempre comunitário, solidário. Somos ovelhas do seu rebanho, membros de
um povo solidário no pecado e na graça. Recebemos o bônus e o ônus de estarmos
ligados a um povo e a um mundo que caminha para a liberdade tropeçando nos
próprios pés, mas que também mantem o olhar fixo naquele que vai à sua frente.
Deus quis nos salvar constituindo-nos como povo!
O sonho de Deus, afirmado, firmado e
confirmado por Jesus Cristo, é que a vida floresça em todas as dimensões, em
todas as criaturas. Não se trata de uma vida miúda, apertada e resignada, mas
de uma vida abundante, transbordante, de um bem viver. Esta vida não germina
senão na terra fecundada pelo dom de si. É entrando e saindo do redil de Jesus
Cristo, vivendo nossa vida como dom, que encontraremos pastagem. É na ousadia
de ir além dos limites e muros erguidos para defender privilégios e ideologias
mesquinhas que encontraremos o alimento que sustenta esta vida tão sonhada.
Escrevendo a uma comunidade imersa numa
situação de dura perseguição, Pedro convida os cristãos de todos os tempos a
suportarem com paciência, como Jesus, os sofrimentos causados por terem feito o
bem. Isso porque a vida abundante é um milagre que costuma contar com o
engajamento crítico e profético de homens e mulheres que, conscientes de serem
chamados para fora, se engajam na política, nas iniciativas e movimentos que
protestam, reivindicam e transformam as estruturas sociais, jurídicas e
econômicas e, com isso, acabam atraindo incompreensões, difamações e
perseguições.
Senhor da messe e pastor do rebanho: faz que
reconheçamos tua voz e tua presença no meio de nós e à nossa frente. Ajuda-nos
a suportar com serenidade as perseguições que nosso trabalho e testemunho porventura
causarem. Dá-nos coragem e liberdade para fazermos da Igreja um lugar de
passagem, um espaço onde entramos e de onde saímos para transformar o mundo.
Concede-nos mais operários para o trabalho do Reino, mas também a corajosa
liberdade de remover os entulhos de leis e tradições que impedem a tantos
irmãos e irmãs realizar sua própria vocação. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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