Qual é a palavra que alimenta nossa fome de
vida e dignidade?
O evangelho proposto para este domingo é parte
do sexto capítulo de João. Tudo começou com a partilha dos pães e dos peixes
entregues a Jesus por um jovem e partilhados com uma multidão. Entusiasmada com
a abundância de alimento, a multidão quis transformar Jesus em rei, mas ele
fugiu de fininho. Diante desta recusa de Jesus, os discípulos ficaram
desorientados e pensaram em fugir. Mas Jesus foi ao encontro deles, no meio do
mar agitado. E, depois disso, Jesus desenvolve uma longa catequese sobre o pão
verdadeiro, o pão que nos alimenta verdadeiramente e merece ser buscado.
Esta longa reflexão sobre o pão que dá vida
não tem nada de inocente, espiritualista ou inofensivo, e os discípulos o entenderam
perfeitamente. Por isso, no fim da reflexão, disseram a Jesus que seu modo de
falar era duro demais e que era difícil continuar ouvindo seu ensino. A razão
da crise dos discípulos é seguir alguém que não aceita ser rei; que pede para
renunciar à ambição individual de estar à sua direita ou à sua esquerda; que
propõe a entrega de si mesmo como caminho de realização; que insiste que
vulnerabilidade é força; que indica a atitude de servo como a mais nobre e
digna do ser humano...
Sedentos de triunfo e de sucesso, muitos
discípulos, frustrados e rebelados, abandonam o seguimento de Jesus. Sem se
importar com isso, Jesus provoca ainda mais os discípulos já escandalizados,
enfatizando que é próprio do ser humano descer, que quem é rebaixado é visto por
Deus como o mais nobre e perfeito. A partir disso, muitos discípulos voltam
atrás, e não andam mais com Jesus. Eles buscam um Enviado diferente, um Messias
feito à medida dos interesses individuais e da própria classe. Sem receio de
ficar só, Jesus enfrenta também os que permanecem: “Vocês também querem ir
embora?”
Jesus é a Palavra de Deus feita carne
solidária, e suas palavras são portadoras de dignidade e vida. Pedro entendeu
bem: “Tu tens palavras de vida eterna.” Ele
sabia muito bem que, diante de Jesus, todos se descobrem pessoas dignas e
capazes, conduzidas a uma liberdade sempre mais plena e exigente, portadores de
uma vida cada vez mais plenificada, peregrinos de um caminho que liberta porque
jamais termina. Mas não é possível ser cristão e, ao mesmo tempo, permanecer
dentro das premissas da cultura individualista. Não podemos cair na tentação,
sempre presente e forte, de adocicar e amenizar a mensagem de Jesus Cristo, submetendo-a
ao nosso desejo de prosperidade e grandeza.
Crer em Jesus significa experimentar uma
liberdade radical, capaz de promover a liberdade de quem convive conosco. Só
quem foi libertado de tudo está em condições de servir. “Sejam submissos uns
aos outros no amor de Cristo”, pede Paulo aos esposos e a todos os cristãos. Submissão
(missão subalterna) significa estar à disposição do outro, e isso nos leva a
assumir o fardo do outro, a ser substituto, a suportá-lo nas penas e
sofrimentos, nos sonhos e buscas. Paulo aplica isso à relação entre marido e
mulher, mas a reciprocidade no amor e no serviço se aplica a todas as relações.
Eis a novidade cristã!
Itacir Brassiani msf
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