Fomos escolhidos em Cristo para testemunhar e louvar a
glória de Deus!
Elisabete da Trindade foi profundamente tocada pela carta de
Paulo aos Efésios. A primeira referência que ela faz ao hino da carta aos
Efésios no texto espiritualmente e humanamente denso do Último Retiro (UR) está
no § 1, do primeiro dia, e é uma citação indireta de Ef 1,12. Aqui Elisabete
destaca que Deus "me elegeu nele" (em Cristo) na história e na
eternidade para ser "o louvor da sua glória". O contexto literário é
o da disposição para iniciar o retiro e viver o final de sua vida cristã: não
desejar conhecer outra coisa ou realidade senão Jesus Cristo e tomar parte nos
seus sofrimentos, identificar-se com Ele no seu ministério de compaixão.
Inspirando-se na metáfora do canto coral, Elisabete escreve
que o refrão que deve ser repetido no hino de louvor cantado com a vida é a
identificação com Jesus Cristo na sua compaixão para com a humanidade, porque é
isso que o próprio Deus fez através de Jesus Cristo em benefício dos pagãos e,
ao mesmo tempo, essa é a herança dada aos cristãos e assumida pessoalmente por
ela mesma.
A glória de Deus é o ponto final e culminante da salvação, a
integração e comunhão plena do universo em Jesus Cristo, e isso leva o
discípulo de Jesus a estar diante dele em atitude de adoração. Isabel entende
que essa adoração se realiza na transposição pessoal (assumir a posição dele)
em Cristo ou na identificação (assimilar sua identidade ou sua atitude) com
Ele, "exemplar divino", com seus sofrimentos e sua morte "por
amor". É evidente que aqui está presente o pressentimento de sua própria
morte, que Isabel conta como próxima. De qualquer maneira, sua intuição de
Elisabete é muito interessante: o discípulo de Cristo será o "louvor da
glória de Deus" na medida em que viver com Ele sua paixão pelo mundo.
A ideia da eleição por parte de Deus (Ef 1,4) reaparece no
9° dia, § 23, dentro da meditação sobre a santidade, que Elisabete concebe como
"caminhar na presença de Deus sendo perfeita". Aqui, a ênfase está na
expressão "para que sejamos santos e sem defeito, diante dele no amor".
Assim, Elisabete chama a atenção para a relação de proximidade entre santidade
ou perfeição e amor. Ao mesmo tempo, registra que Paulo mergulhou no abismo dos
conselhos de Deus e, por isso, ela deseja segui-lo para não errar na
"senda magnífica da presença de Deus". Aparecem com destaque as
sugestivas imagens do caminho (para Deus) e da presença (de Deus).
Nas anotações do 14° dia (§ 36), ao ensaiar respostas ao
chamado à santidade no amor e ser o "louvor da glória de Deus",
Isabel cita de novo Ef 1,4.10-11, relacionando-o com Fil 3,7-14. Diz
explicitamente que "é preciso ser transformado em Jesus Cristo" (§
37), ser a sua imagem (cf. Rm 8,29), o que supõe "estudar o divino
modelo". Citando também Hb 10,9, Isabel diz que o caminho para isso é
fazer a vontade do Pai, como Cristo mesmo a fez. Sem isso não há como
"exprimi-lo continuamente aos olhos do Pai". Realizar essa vontade é
o alimento e a imolação de todo discípulo, sua paixão com Cristo e em Cristo.
Quando despojado de outra vontade ou interesse, o discípulo pode então rezar
verdadeiramente. A pessoa louva e glorifica a Deus na medida em que encarna a
atitude (forma) de Cristo e realiza, como ele, a vontade do Pai.
No texto do 3° dia (§ 6), ao desenvolver o tema do caminho
para a santidade, Elisabete começa citando Ef 1,11-12: "Conforme o projeto
daquele que tudo conduz segundo sua vontade, fomos predestinados a ser o louvor
da sua glória..." Com a ajuda de São Paulo, ela entende que é este "o
mistério que esteve sempre escondido em Deus" (Ef 3,9). E essa
predestinação se realiza quando somos "santos e sem defeitos diante dele
no amor" (Ef 1,4). Para ser o louvor da glória de Deus, a jovem carmelita
entende que deve manter-se sempre e em tudo na sua presença, no amor, isto é,
no próprio Deus. Essa forma de viver a comunhão com o Ser ou com o Amor divino
é que nos faz santos. Elisabete entende o amor como o repouso no abismo
insondável de Deus, como conhecer Deus como Ele nos conhece, desenvolver um
olhar simples e intuitivo, transformar-se na sua imagem, ser seu esplendor.
O amor é atitude, relação, vontade, e não um mero
sentimento. Assim, repousar no abismo insondável de Deus significa
estabelecê-lo como fundamento e dinamismo de todas as relações, de forma que é
agindo em conformidade com Deus e seu projeto, tratando as pessoas como Deus
mesmo as trata, vale dizer, com compaixão e solidariedade, que o discípulo
permanece na sua presença e se torna um louvor de sua glória.
Itacir Brassiani msf
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