Desejoso de ser visto e reconhecido, o fariseu reza de pé, e
olha os demais de cima para baixo. Sua oração é uma espécie de autoelogio,
marcada pelo desprezo e pela condenação dos demais, considerados inferiores e
pecadores. É como se Deus fosse obrigado a agradecer o fariseu por ele ser bom
e correto. O publicano não entra no templo e, sem coragem até de levantar os
olhos, bate no peito reconhecendo sua condição ambivalente e pedindo que Deus
se compadeça dele. É bem possível que estas diferentes posturas na oração não
sejam um problema somente do judaísmo, nem dos primeiros cristãos...
A ostentação e a pretensão de superioridade, sempre
acompanhadas de uma agressiva discriminação, contaminaram também os cristãos e,
infelizmente, resistem, como erva daninha difícil de erradicar, até nossos
dias. E, o que é pior, quase sempre vêm revestidas com a atraente roupagem da
piedade... Mas, desde o mito bíblico de Abel e Caim, sabemos que Deus que não
trata todas as pessoas do mesmo modo. “Ele não é parcial em prejuízo do pobres,
mas escuta, sim, as súplicas dos oprimidos; jamais despreza a súplica do órfão,
nem da viúva, quando desabafa suas mágoas”, lembra o livro do Eclesiástico.
Por outro lado, precisamos lembrar que, por mais que nos
custe admitir, nosso mundo está dividido. Não é necessário viajar o mundo para
perceber que, em termos gerais, os países do Norte, vivem na abundância de bens
e oportunidades, enquanto que os países do Sul são condenados a digerir a
miséria à qual a secular expropriação os condenou. E existem também divisões
entre pessoas e grupos sociais... Basta lembrar a primazia que a mídia dá às
pessoas e grupos ocidentais, brancos, masculinos, cultos e ricos. Os negros e
índios, as mulheres, os analfabetos e os pobres são tratados como inferiores.
Será que esta divisão nefasta e nada evangélica está
presente também no interior das nossas igrejas? Infelizmente, parece que sim!
Basta dar uma olhada atenta à primazia conferida às Igrejas europeias – à
teologia, ao direito e à liturgia por elas elaboradas – no confronto com as
Igrejas do Terceiro Mundo. E não podemos esquecer aquela profunda e dolorida
divisão – que às vezes se transforma em oposição e em condenação recíproca –
entre as próprias comunidades cristãs: ortodoxos e romanos, católicos e
protestantes, igrejas clássicas e igrejas pentecostais, e assim por diante.
Fariseus versus publicanos!
A humanidade tem como vocação ser uma só família, e essa é
também a vontade de Deus. A interdependência dos povos e nações é já um fato
objetivo, mas precisa se tornar um valor subjetivo, garantido ética e
institucionalmente. O desafio é transformar essa solidariedade objetiva e
estrutural num valor buscado e assegurado para todos. A dignidade da pessoa
humana independe da sua origem étnica, da pertença religiosa, da nacionalidade,
da convicção política, da identidade sexual, da instrução. Estas diferenças não
dividem, nem hierarquizam; apenas distinguem, complementam e enriquecem.
Ao ouvir a prece da pessoa humilde e discriminada, Deus
resgata sua dignidade e a verdadeira igualdade entre todos os seres humanos. A
este propósito, é impressionante o testemunho de Paulo. Ele combate com
tenacidade a pretensão de superioridade dos judeus e dos novos cristãos de
origem judaica frente aos cristãos vindos do paganismo. Quando diz, em forma de
testamento, que combateu o bom combate, completou a corrida e guardou a fé,
está se referindo à sua convicção de que Cristo é nossa paz, pois de dois povos
fez um só povo, derrubando o muro da inimizade que os separava (cf. Ef 2,14).
Deus Pai e Mãe, tu fazes a prece do humilde atravessar as
nuvens e escutas atenta e cordialmente o clamor dos oprimidos. Então,
despoja-nos de todo orgulho arrogante e de toda competição infantil. Ajuda-nos
a anunciar teu Evangelho integralmente e a fazer resplandecer, pelo anúncio e
pelo testemunho, a boa notícia e a boa convivência que ele nos pede. Ajuda-nos
a vislumbrar em Jesus teu rosto compassivo e misericordioso, e anunciá-lo a
todos. E isso até que a humanidade seja de fato uma só família, na qual todos
os membros são queridos e respeitados, para além de toda e qualquer diferença.
Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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