Síntese da mensagem: Continuamos no ano da misericórdia.
Toda a liturgia de hoje está impregnada dessa infinita misericórdia de Deus.
Deus perdoa os pecados do rei Davi, porque se arrependeu quando o profeta Natã
colocou diante dos seus olhos os pecados horrendos do rei (1 leitura). São
Paulo também experimentou essa misericórdia gratuita de Deus, em Cristo, que o
amou e se entregou por ele, a quem Paulo aceitou pela fé (2 leitura). A mulher
adúltera do evangelho, já arrependida, oferece uma liturgia penitencial cheia
de amor a Cristo na casa do fariseu com esses gestos: com as suas lágrimas
banhou os pés de Jesus, enxugou-os com os seus cabelos, beijou-os e os ungiu
com um perfume precioso. Grande é a misericórdia de Deus ao perdoar os nossos
pecados, e não nos condenar nem ser indiferente diante de nós.
Pontos da ideia principal:
Em primeiro lugar, contemplemos a primeira forma de ver o
pecador: condena. Eis esse fariseu que convidou Jesus para comer. Nenhum
detalhe com Jesus: nem lhe ofereceu água para se lavar; nem lhe deu o ósculo da
paz. Só tinha olhos e coração para condenar, não só essa mulher pecadora que
tocava Jesus, mas o mesmo Jesus que permitia esse escândalo de deixar-se tocar
por uma pecadora. Cego de olhos e de coração, este fariseu não vê nada do que
tem de belo nessa atitude da mulher! Aliás, julga e critica. Julga a mulher,
sem se interessar da mudança de atitude que manifesta o seu comportamento.
Crucificou a mulher na categoria dos pecadores e não admite que possa sair
dela. Julga também Cristo, quem convidou por curiosidade e não por amor e
desejo de escutá-lo, ao ver o entusiasmo que provocava em tantas pessoas. Que
dó desse fariseu! Esteve tão perto de Jesus e não permitiu ser tocado pela sua
misericórdia. Nem sequer Jesus o condena: simplesmente fá-lo refletir na sua
postura para se corrigir e se converter. E o faz com essa parábola que
desencadeia umas consequências: a generosidade desta mulher pecadora arrependida
se contrapõe à mesquinhez e à frieza do fariseu que faltou à mais elementar
cortesia com esse hóspede.
Em segundo lugar, contemplemos a segunda forma de ver o
pecador: indiferença. Eis os outros comensais convidados pelo fariseu para
comer. Nada dizem. Nada lhes interessa. Estão aí, comendo e aproveitando a
tertúlia. Cada um seguramente diria: o que eu tenho que ver com isso? O Papa
Francisco está falando frequentemente da cultura e da globalização da
indiferença. Em Lampedusa, na pequena ilha do sul da Sicília e celebre pelo
desembarque contínuo de imigrantes, o Papa exclamou assim: “Quem de nós chorou
a morte destes irmãos e irmãs, de todos aqueles que viajavam sobre as barcas,
pelas jovens mães que levavam os seus filhos, por estes homens que buscavam
qualquer coisa para manter as suas famílias? Somos uma sociedade que esqueceu a
experiência do pranto… O almejo pelo insignificante, pelo provisório, leva-nos
à indiferença com relação aos demais, leva-nos à globalização da indiferença”.
Foi a sua primeira viagem oficial. Continuava o Papa: “Quem é o responsável
pelo sangue destes irmãos? Ninguém. Todos respondemos: não fui eu, eu não tenho
nada que ver, serão outros, mas eu não. Hoje ninguém se sente responsável,
perdemos o sentido da responsabilidade fraterna, caímos no comportamento
hipócrita (…). Olhamos para o irmão meio morto à margem da caminho e talvez
pensamos: coitadinho, e continuamos o nosso caminho, que é assunto nosso, e
assim nos sentimos tranquilos. A cultura do bem-estar, que nos leva a pensar só
em nós mesmos, converte-nos em insensíveis ao grito dos outros, faz-nos viver
em bolhas de sabão, que são bonitas, mas são inúteis, não são nada…”. Diante do
pecador, esta globalização da indiferença se faz mais culpável e nos converte
em cúmplice dos pecados dos nossos irmãos: “Por acaso sou guardião do meu
irmão?” – exclamou Caim a Deus quando lhe pediu contas do sangue do seu irmão
Abel. Sim, somos guardiões e temos que ajudar os nossos irmãos a sair do pecado
e aproximá-los do Salvador.
Finalmente, contemplemos a última forma de ver o pecador: o
perdão. Eis Jesus. Enquanto Jesus vir arrependimento, as suas entranhas se
comovem. De entrada digamos que a misericórdia de Deus, encarnada em Cristo,
escandalizou os juristas e fariseus do seu tempo. Dizia o pregador dos
exercícios espirituais deste ano 2016 ao Papa e à cúria romana que os fariseus
de todas as épocas colocam o pecado “no centro da relação com Deus”, porém “a
Bíblia não é um ídolo ou um totem”; exige “inteligência e coração”. Os poderes
que não duvidam em usar uma vida humana e a religião “colocam Deus contra o
homem”. E esta é “a tragédia do integrismo religioso”. “O Senhor não suporta os
hipócritas, os que levam máscaras, os que têm coração duplo, os comediantes da
fé e não suporta os acusadores e os juízes”. O gênio do cristianismo esta, pelo
contrário, no abraço entre Deus o homem. “Já não se opõem”, “matéria e espírito
se abraçam”. A doença que Jesus mais teme e combate é “o coração de pedra” dos
hipócritas: “violar um corpo, culpável ou inocente, com as pedras ou com o
poder, é a negação de Deus que vive nessa pessoa”. Que liturgia penitencial tão
linda realizou essa mulher pecadora com Jesus na casa do “justo” fariseu: lavou
os pés de Jesus com as suas lágrimas de arrependimento, enxugou-os com os seus
cabelos de bondade, beijou-os com os seus lábios de ternura e os ungiu com o
perfume do seu amor! O que outrora lhe serviu para pecar, agora, arrependida,
deixa aos pés de Jesus. Mulher nova, redimida, perdoada, levantada, purificada.
Sentiu-se não só perdoada, mas honrada com os elogios de Jesus devido aos seus
gestos.
Para refletir: Qual destas três posturas eu tenho diante do
pecador: condena, indiferença ou perdão? Rezo pelos pecadores? Reconheço-me
pecador e me abro à misericórdia de Deus na confissão? Pensemos nesta resposta
que o Papa Francisco deu numa entrevista que lhe fizeram na casa Santa Marta em
dezembro de 2014:
A renovação da Igreja a qual o senhor chama desde que foi
eleito aponta também a buscar estas ovelhas perdidas e a frear essa sangria de
fiéis?
Não gosto de usar essa imagem da “sangria” porque é uma
imagem muito ligada ao proselitismo. Não gosto de usar termos ligados ao
proselitismo porque não é a verdade. Gosto de usar a imagem de hospital de
campo: tem gente muito ferida que está esperando irmos para curar as feridas,
feridas por mil motivos. E temos que sair para curar as feridas. Tem gente
ferida por desatenção, por abandono da Igreja mesma, gente que está sofrendo
horrores…
Para rezar: Salmo 50 (51)
Tende piedade de mim, ó Deus, pela vossa bondade,
Por vosso grande coração, apaga a minha culpa.
Que a minha alma fique limpa de malícia,
Purificai-me do meu pecado.
Pois a minha falta eu a conheço bem
E meu pecado está sempre diante de Vós;
Contra Vós, só contra Vós que eu pequei,
Pratiquei o que é mal aos vossos olhos.
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