Nesta Solenidade do Precursor de Jesus nada melhor que conhecer que nos diz os santos da Igreja e desta vez será de Santo Agostinho.
VOZ QUE CLAMA NO DESERTO
A Igreja celebra o nascimento de
João como um acontecimento sagrado. Dentre os nossos antepassados, não há
nenhum cujo nascimento seja celebrado solenemente. Celebramos o de João,
celebramos também o de Cristo: tal fato tem, sem dúvida, uma explicação. E se
não a soubermos dizer tão bem, como exige a importância desta solenidade, pelo
menos meditemos nela mais frutuosa e profundamente. João nasce de uma anciã
estéril; Cristo nasce de uma jovem virgem.
O pai de João não acredita que
ele possa nascer e fico mudo; Maria acredita, e Cristo é concebido pela fé. Eis
o assunto que quisemos meditar e prometemos tratar. E se não formos capazes de
perscrutar toda a profundeza de filo grande mistério, por falta de aptidão ou
de tempo, aquele que fala dentro de vós, mesmo em nossa ausência, vos ensinará
melhor. Nele pensais com amor filial, a ele recebestes no coração, dele vos
tomastes templos.
João apareceu, pois, como ponto
de encontro entre os dois Testamentos, o antigo e o novo, O próprio Senhor o
chama de limite quando diz: A lei e os profetas até João Batista (Lc 16,16).
Ele representa o antigo e anuncia o novo. Porque representa o Antigo
Testamento, nasce de pais idosos; porque anuncia o Novo Testamento, é declarado
profeta ainda estando nas entranhas da mãe. Na verdade, antes mesmo de nascer,
exultou de alegria no ventre materno, à chegada de Maria. Antes de nascer, já é
designado; revela-se de quem seria o precursor, antes de ser visto por ele.
Tudo isto são coisas divinas, que ultrapassam a limitação humana. Por fim,
nasce. Recebe o nome e solta-se a língua do pai. Relacionemos o acontecido com
o simbolismo de todos estes fatos.
Zacarias emudece e perde a voz
até o nascimento de João, o precursor do Senhor; só então recupera a voz. Que
significa o silêncio de Zacarias? Não seria o sentido da profecia que, antes da
pregação de Cristo, estava, de certo modo, velado, oculto, fechado? Mas com a
vinda daquele a quem elas se referiam, tudo se abre e toma-se claro. O
fato de Zacarias recuperar a voz no
nascimento de João tem o mesmo significado que o rasgar-se o véu do templo,
quando Cristo morreu na cruz. Se João se anunciasse a si mesmo, Zacarias não
abriria a boca. Solta-se a língua, porque nasce Aquele que é a voz. Com efeito,
quando João já anunciava o Senhor, perguntaram-lhe: Quem és tu? (Jo 1,19). E
ele respondeu: Eu sou a voz do que clama no deserto (Jo 1,23). João é a voz; o
Senhor, porém, no princípio era a Palavra (Jo 1,1). João é a voz no tempo;
Cristo é, desde o princípio, a Palavra eterna.
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