O Padre Geral Savério Canistrá da Ordem Carmelita por ocasião da canonização de Elisabete da Trindade escreveu uma linda carta a todos os carmelitas e as irmãs. Deixamos aqui um pequeno texto desta carta. Neste dia 08 celebramos a memória de Santa Elisabete e ela tem muito a nos dizer.
VIVER POR AMOR
Um fio condutor une a experiência de Elisabeth desde quando
era criança até quando – ainda jovem, mas já amadurecida – sobrevier a morte: a
intuição de que a única coisa importante é “viver por amor”. Encontra em Jesus,
crucificado por amor (cf. C 133), o Deus que é capaz de vencer seu temperamento
impetuoso e colérico e empolgar seu coração sensível e sedento de beleza. N’Ele
vê e toca um amor apaixonado e apaixonante, que a conquista e a faz decidir, em
tenra idade, ser toda sua. É o contato que se dará no mais belo dia de sua
vida, o dia de sua primeira Comunhão, “Em que Jesus fez em mim sua morada,/Em
que Deus tomou posse de meu coração,/Tanto e tão bem que desde essa hora,/Desde
esse colóquio misterioso,/Não aspirava senão a dar a minha vida,/A devolver um
pouco de seu grande amor/Ao Bem-Amado da Eucaristia,/Que repousava em meu fraco
coração,/Inundando-o de todos os seus favores” (P 47).
As
dificuldades que deve enfrentar em seu processo de amadurecimento – como o
contraste entre o desejo de entrar no Carmelo e a oposição da mãe, a quem tanto
ama; querer permanecer recolhida em intimidade com Jesus e participar em festas
dançantes, onde jovens fascinados por sua beleza demonstravam interesse por
ela; sentir-se chamada à solidão, que exige desapego e separação, e estar
envolvida em tantas atividades artísticas e sociais; dar todo o coração a Deus
e, ao mesmo tempo, ser disponível e afeiçoada às suas amigas – encontram sua
solução na atração que exerce sobre ela “o grande amor” de Cristo, que
resplandece na Cruz, lenho capaz “de atear na alma o fogo do amor” (C 116).
Entre as
citações mais amadas por Elisabeth está o incipit do hino da carta aos Efésios,
onde São Paulo anuncia o destino glorioso do homem, dizendo que fomos pensados,
abençoados e predestinados desde a eternidade “para ser santos e imaculados
diante d’Ele, no amor” (Ef 1, 4). Por isso, “a alma que discute com o seu eu,
que se ocupa com as próprias sensibilidades, que segue um pensamento inútil, um
desejo vão, dispersa as forças e não está toda voltada para Deus” (Último
retiro,3). Tudo que não é feito por Deus é nada (cf. C 285), esvazia ao invés
de preencher, dispersa ao invés de reunir. Não é a atividade que dispersa, mas
o fato de não crer “que um Ser, chamado Amor, habita em nós” (C 284), de não
estar unidos ao Ser que nos ama, ao Pai que, em Cristo, nos espera em sua casa
e com Seu Espírito nos sustenta no caminho.
O grande ato
da fé – recorda-nos Elisabeth, fazendo eco ao evangelista João – é acreditar no
imenso amor que Deus tem por nós (cf. O Céu na fé, 20). A unificação da pessoa
se dá, pois, pelo poder do ato de fé e reverbera na sensibilidade. Portanto,
para crescer harmonicamente, curar as feridas da vida e amadurecer como pessoa,
não se deve ter como objetivo o cuidado do próprio eu ou a superação da própria
debilidade, mas antes sair de nós mesmos, deixar o próprio eu (cf. Último
Retiro, 26) em uma vantajosa troca com o eu de Cristo, que “quer consumir nossa
vida para mudá-la na sua: a nossa, cheia de vícios; a sua, cheia de graça e de
glória, totalmente preparada para nós, com a única condição de nos renunciarmos
a nós mesmos” (O Céu na fé, 18).
O
segredo é, então, reconhecer o quanto somos amados, fixando os olhos no Mestre
que veio acender o fogo do amor e quer vê-lo arder em seus discípulos, para que
se espalhe visivelmente em todo o mundo. O amor divino é de tal modo excessivo
e sem medidas que arrasta a alma que o permite, tornando-a constante, não mais
sujeita aos solavancos imprevisíveis e inevitáveis da vida, “porque vê o
Invisível” e “não se detém mais nos gostos e nos sentimentos”; acontece
verdadeiramente que “mais a alma é provada, mais aumenta a sua fé, porque
transpõe, por assim dizer, todos os obstáculos para ir repousar no seio do amor
infinito cujas obras só podem ser de amor” (O Céu na fé, 20). Aliás, essa é a
experiência humana do Filho enviado pelo Pai à terra e acolhido pela humilde Mãe;
esse é o anseio inscrito no ser de cada homem; essa é a graça do batismo que,
por tal razão, constitui um novo nascimento, uma iluminação permanente para
quem faz memória dele; é o início da vida eterna (cf. O Céu na fé, 2).
Nenhum comentário:
Postar um comentário